Direito Autoral

Desrespeitar os direitos autorais é crime previsto na Lei 9610/98.

09 novembro 2012

Em defesa dos Guarani-Kaiowá - II


Fonte: JC/SBPC Washington Novaes é jornalista. Artigo publicado no jornal O Estado de São Paulo de hoje (9).

Há mais de 20 anos - 15 dos quais nesta página - o autor destas linhas escreve sobre a situação dramática dos índios guarani-caiovás, em Mato Grosso do Sul (MS). Naquele tempo já eram centenas os casos de suicídio entre essa gente (a segunda maior etnia indígena no País, 45 mil pessoas). E já nesse tempo eles não tinham onde viver segundo seus formatos próprios - as terras para as quais gradativamente os expulsavam eram muito pequenas, não permitiam manter a tradição de plantar, colher, caçar, pescar. Fora de suas terras, sem formação profissional adequada, seguiam a trajetória fatal: trabalhar como boias-frias, tornar-se alcoólatras, mendigos, loucos. E suicidas, como o jovem de 17 anos que se matou no dia seguinte ao de seu casamento - enforcou-se numa árvore e, sob seus pés, na terra, deixou escrito: "Eu não tenho lugar".
Quando ganhou espaço na comunicação a atual crise em dois hectares onde vivem 170 índios (Estado, 29/10), dois dias antes se suicidara um jovem de 23 anos, pelas mesmas razões. Felizmente, a desembargadora Cecília Mello, do Tribunal Regional Federal, determinou que os guarani-caiovás permaneçam na área até que se conclua a delimitação da que lhes deve caber - e onde estão "em situação de penúria e falta de assistência", o que, segundo ela, "reflete a ausência de providências do poder público para a demarcação das terras". Dizia o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), nesse momento, que 1.500 guarani-caiovás já se haviam suicidado.
Só pode levar ao espanto trazer à memória que havia 5 milhões de índios ocupando os 8,5 milhões de quilômetros quadrados em 1500, quando aqui chegaram os colonizadores - ou seja, cada um com 1,7 quilômetro quadrado, em média. E hoje os guarani-caiovás da aldeia em questão precisam ameaçar até com suicídio coletivo para manterem 170 pessoas em dois hectares, 20 mil metros quadrados, menos de 120 metros para cada um, pouco mais que a área de um lote dos projetos habitacionais de governos. Mas nem isso lhes concedem.
Talvez já tenha sido mencionado em artigo anterior pensamento do antropólogo Lévi-Strauss num de seus livros, no qual se perguntava por que os índios brasileiros, que eram milhões, não massacraram os primeiros colonizadores, que eram umas poucas centenas. Teria sido muito fácil. Mas ele mesmo respondia: não só não mataram, como os trataram como fidalgos; porque na cosmogonia do índio brasileiro está sempre presente a chegada do outro - e esse outro é o limite da liberdade de cada pessoa. Tal como pensava outro antropólogo, Pierre Clastres (A Sociedade contra o Estado): nas culturas indígenas não há delegação de poder, ninguém dá ordens; cada indivíduo é livre; mas o limite da liberdade de cada pessoa está em outra pessoa. Só que o respeito à liberdade dos colonizadores custou aos índios o massacre. E situações como as que vivem hoje.
De pouco têm adiantado relatórios de organismos internacionais, entre eles o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), que destacam a importância (a começar pelo Brasil) das áreas indígenas para a conservação da biodiversidade, em perigo no mundo. Também têm sido esquecidas as lições do jurista José Afonso da Silva, que com seu parecer levou o Supremo Tribunal Federal a decidir pelo direito dos índios ianomâmis à demarcação de suas reservas, em Roraima: é um direito reconhecido desde as ordenações da coroa portuguesa, no século 17.
Mas quem comove o poder brasileiro? Ainda no ano passado - talvez também já tenha sido comentado aqui -, quando completou meio século a criação do Parque Indígena do Xingu pelo presidente Jânio Quadros, por proposta dos irmãos Villas Boas, o autor destas linhas, com apoio do ex-ministro Gilberto Gil, do artista plástico Siron Franco, do compositor e criador Egberto Gismonti, do ex-presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai) Márcio Santilli - entre muitas outras pessoas -, tentou levar à Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) a proposta de transformar o parque em patrimônio ambiental, histórico e cultural da humanidade. Afinal, naqueles 26 mil quilômetros quadrados, onde vivem 16 povos, está um pedaço riquíssimo do patrimônio ambiental brasileiro - de sua flora, sua fauna, seus recursos hídricos -, hoje cercado pelo desmatamento e pelo plantio de grãos; um pedaço importante da nossa História, pois a presença de etnias por ali tem mais de 2 mil anos; um pedaço valioso do patrimônio cultural, com todas as manifestações lá nascidas e que perduram. Mas para que a Unesco receba um pedido como esse é imprescindível - foi-nos dito - que ele tenha o aval de alguma autoridade brasileira. E não conseguimos sequer uma audiência da Funai ou de outro órgão para expor o pleito.
Não estranha. Aprendemos mais uma vez que uma iniciativa como essa é considerada "ameaça à soberania nacional e ao uso de recursos naturais". Tal como já acontecera em 2002, quando o autor destas linhas, membro da comissão que preparava o projeto da Agenda 21 brasileira, observou, numa reunião, que faltava no texto um capítulo sobre clima e mudanças nessa área. E propunha que ele fosse escrito. Imediatamente o representante do Itamaraty na comissão se levantou e impugnou a proposta, alegando que "essa área, que envolve a soberania brasileira, é privativa das Forças Armadas e do Itamaraty". Ponto final. Já promulgada a Agenda, no início do novo governo, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) pediu que este escriba a representasse na Comissão da Agenda. A proposta do capítulo sobre clima e desenvolvimento sustentável foi reapresentada e aprovada em princípio. Mas jamais foi discutida. Morreu.
Tampouco estranha, assim, que os guarani-caiovás enfrentem esse calvário. Se o Parque do Xingu não pode ter prioridade, se centenas de milhares de índios em todo o País vivem um drama diário, que importância tem para o poder a sina de algumas dezenas de guarani-caiovás perdidos em meio à soja sul-mato-grossense?

* A equipe do Jornal da Ciência esclarece que o conteúdo e opiniões expressas nos artigos assinados são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a opinião do jornal.






  

quinta-feira, 1 de novembro de 2012


Em defesa dos Guarani kaiowá - I



Guarani Kaiowá: deputados apelam a Dilma e à ONU 
Deputados da Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM) enviaram ontem uma carta à presidente Dilma Rousseff em que pediram atenção especial à situação vivida pelos Guarani Kaiowá. A CDHM mandará ainda um documento à ONU e à OEA para alertá-las sobre as condições de tensão e risco que os indígenas enfrentam no Brasil, em especial os de Mato Grosso do Sul. Ontem em Brasília, mais de 400 pessoas, entre estudantes e representantes de movimentos sociais, marcharam na Esplanada dos Ministérios em defesa do povo Guarani Kaiowá. Outra marcha a favor dos indígenas está marcada para 9 de novembro -CB, 1/11, Brasil, p.10. 

Morosidade do Estado 
"Com a exploração do solo, principalmente pela criação do gado, as fazendas começaram a tomar espaço das reservas. Sassoró, por exemplo, que tinha 3,6 mil hectares, hoje tem 1,7 mil hectares. O resultado é muito índio vivendo em áreas pequenas. Bororó, em Dourados, tinha 500 pessoas em 1940, em 1980 já eram 1,5 mil. Vários problemas levaram o índio a reivindicar a terra tradicional dele. Só que o fazendeiro também não quer sair, porque ele comprou a terra. Muitos fazendeiros compraram sem saber que havia índios ali. Outros sabiam. Mas, eles pensavam: 'ah, tem índio, mas índio a gente manda embora, mata, resolve'. Com a Constituição de 1988, nossos direitos começaram a ser respeitados. O governo precisa apressar as demarcações, precisa ser mais ágil para solucionar esses conflitos, que trazem muito sofrimento e violência", diz em entrevista Tonico Benites, ou Ava Verá Arandú - CB, 1/11, Brasil, p.10.

Fonte: ISA

sábado, 27 de outubro de 2012


Prêmio Culturas Indígenas. Participe!





          O Prêmio Culturas Indígenas foi criado pelo Ministério da Cultura, em 2006, em parceria com organizações da sociedade civil e com o colegiado setorial de culturas indígenas. Seu objetivo é o de apoiar iniciativas de caráter coletivo que valorizem as culturas indígenas.
          A cada edição, o prêmio homenageia uma liderança indígena. Nesta edição, o homenageado é o Cacique Raoni Metuktire, conhecido internacionalmente por sua luta pelos direitos dos povos indígenas e pela preservação das florestas e dos rios da Amazônia.
          As inscrições só começam dia 05 de novembro, mas o edital já foi divulgado. quem se interessar pode ler mais sobre o prêmio e como participar no, site: www.premioculturasindigenas.org.br. O período para inscrição é do dia 05 de novembro até 05 de fevereiro de 2013. Participem! Mais informações podem ser obtidas pelos telefones:  (11) 3938-3559 / 3969-3558 ou pelo e-mail: premioculturasindigenas@gmail.com .

sexta-feira, 19 de outubro de 2012


Povo Guarani-Kayowá está cada vez mais ameaçado


Crianças guarani. Foto: Rui Sposaty
Imagem extraída do Google

          O Conselho Federal de Psicologia divulgou nota nesta terça-feira para denunciar ameaça à vida e às terras do povo Guarani-Kaiowá da aldeia Passo Piraju, no Mato Grosso do Sul, após decisão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região de São Paulo que determina despejo dos índios e reintegração de posse da área a um fazendeiro, até a próxima sexta-feira, dia 19 de outubro. Dessa forma, a situação dos Guarani-Kayowá se agrava a cada dia. Leia a nota - Notícias Socioambientais, 17/10.

terça-feira, 9 de outubro de 2012


O espírito da floresta e as eleições de 2012


 Índio votando. Imagem extrída do Google.

De Norte a Sul do Brasil, os povos indígenas marcaram presença nas eleições de 2012. Para quem desconhece a realidade indígena no Brasil talvez considere muito pequeno  o número de candidatos indígenas eleitos. Ao todo são trinta e cinco entre prefeitos e vereadores; desse número, quatro são mulheres indígenas das seguintes etnias: Payaya (Bahia), Terena (Mato Grosso do Sul), Pankará (Pernambuco) e Ingarikó (Roraima);  eleitas vereadoras.
Pernambuco é o Estado que registra o maior numero de candidato: oito. Na sequência vem a Bahia com sete candidatos e seis em Mato Grosso do Sul.
Dos trinta e cinco candidatos, três indígenas ocuparão o cargo de prefeito nas cidades: São João das Missões (Minas Gerais), Uiramotã (Roraima) e Entre Rios (Santa Catarina).
O maior número de votos foi para os seguintes candidatos:
1)   Marcelo Pereira, do povo Xacriabá (Minas Gerais), obteve 3.500 votos ao cargo de Prefeito.
2)   Eliésio Cavalcanti, do povo Macuxi (Roraina), obteve 2.164 votos ao cargo de Prefeito.
3)   Sil Xucuru, do povo Xucuru (Pernambuco), obteve  1.844 votos ao cargo de Vereador 
4)   Aguilera, do povo Terena (Dourados/Mato Grosso do Sul), obteve 1.419 votos ao cargo de Vereador.
5)   João Roque, do povo Kaingang (Santa Catarina), obteve 1.249 votos ao cargo de Prefeito.

Do espírito da floresta
 
Juruna. Imagem extraída do Google.

Há trinta anos, mais precisamente em 1982, quando foi eleito deputado federal com 31.904 votos,  o xavante Mario Juruna foi além do cocar na  luta em defesa dos direitos indígenas . Na época, candidato pelo PDT do Rio de Janeiro, Juruna marcou também a sua atuação na política ao andar em Brasília com um gravador para registrar "promessas de políticos mentirosos" feitas às reivindicações indígenas. No Brasil, Juruna foi o primeiro  indígena a ocupar o cargo de deputado federal.
 Para encerrar esta reflexão, faço uso das boas palavras do jornalista Ulisses Capozzoli (In: “Observatório da imprensa”); ele comenta que o ex-deputado xavante reuniu em si tanto a determinação combativa quanto a simpatia fraterna do povo  juruna: 
Ao denunciar a falta de compromisso com a palavra e recusar ofertas de surborno por compensação pelos atos de subordinação, Mário Juruna insurgiu contra 500 anos de história de desmandos sem, ao final de seu combate, ter ao menos o reconhecimento de que foi um bravo. As histórias que acompanham lendários chefes indígenas da América do Norte (como Corvo Pequeno, dos arapahos; Nuvem Vermelha, dos oglala dakota; Cauda Pintada, dos siox-brulé; Nariz Romano, dos cheyenne do Sul; Cochise, dos chiricahua; Pássaro Saltador, dos kiowa; Dez Ursos, dos comanche; grande Touro Sentado, dos siox), que pegaram em armas para defender seus povos, podem não estender-se a um líder como Juruna, embora sua arma tenha sido pacífica: um gravador de sons. (CAPOZZOLI).

Nordeste do Brasil, 9 de  outubro de 2012
                                                                                                                                        Graça Graúna











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